
A proposta da Organização Mundial da Saúde (OMS) de elevar em 50% os preços de bebidas açucaradas, álcool e tabaco ao longo da próxima década, através de impostos, reacendeu discussões sobre saúde pública e economia. Com a intenção de combater o avanço de doenças crônicas não transmissíveis, esse plano inclui a **proteção dos orçamentos de saúde**, visando prevenir mais de 50 milhões de mortes prematuras nos próximos cinquenta anos.
O cardiologista e professor do Idomed, Herbert Mendes, alerta sobre os sérios riscos à saúde decorrentes do consumo regular de bebidas açucaradas, álcool e tabaco. Essas substâncias estão associadas ao aumento da obesidade, diabetes e hipertensão arterial, o que pode levar a doenças cardiovasculares, como infarto e AVC. Mendes destaca que as bebidas açucaradas são fontes de “calorias vazias”, contribuem para o ganho de peso e o desenvolvimento do diabetes. O consumo de álcool é igualmente prejudicial, já que eleva a pressão arterial e pode resultar em cardiotoxicidade. O fumo, por sua vez, se configura como um agente altamente nocivo, elevando os riscos de infarto, AVC e outras complicações letais.
O especialista enfatiza que mesmo os jovens fumantes têm um risco elevado de sofrer infarto ou AVC. Estudos anteriores já indicam que a redução do tabagismo entre essa faixa etária tem um impacto direto na saúde. “Dizer que o cigarro faz mal apenas a longo prazo é equivocado. Evidências mostram que o risco cardiovascular já aumenta desde cedo”, ressalta.
Os Efeitos da Medida na Economia
Para o economista e professor da Wyden, Franz Pettuceli, o principal impacto da medida será a transformação dos hábitos de consumo e a adaptação da indústria, mais do que um aumento significativo na arrecadação fiscal. “Não acredito que a tributação chegue a um trilhão de dólares. O que veremos é uma migração de produtos nocivos para alternativas mais saudáveis”, afirma.
Pettuceli aponta que o aumento no preço visa priorizar a saúde e reduzir gastos públicos. Ele acredita que a indústria se adequará ao novo cenário, oferecendo opções mais saudáveis, acessíveis até para a população de baixa renda. Para ele, a proposta é comparável às restrições feitas ao cigarro em décadas passadas e vislumbra uma “nova onda fit”, onde as futuras gerações irão se adaptar a novos padrões de consumo. A inclusão de ultraprocessados na legislação pode também catalisar uma mudança cultural em relação à alimentação, retomando práticas de produção mais saudáveis.
Embora reconheça que o aumento de impostos pode resultar em uma dependência fiscal, ele afirma que o consumo deve cair de modo a forçar a indústria a se reinventar. Pettuceli ainda minimiza os riscos de mercado negro, apostando na capacidade do mercado legal de se adaptar.
O professor de economia da Estácio, Hugo Meza, por outro lado, reconhece os benefícios potenciais da política, mas alerta para os efeitos negativos sobre a população de baixa renda, que destina uma maior parte de sua renda a esses produtos. “Para mitigar esse impacto, podemos adotar medidas como reinvestir os recursos arrecadados em programas sociais”, sugere.
Meza também discute a elasticidade-preço da demanda, apontando que, no curto prazo, o consumo tende a ser inelástico; portanto, mesmo com o aumento dos preços, muitos consumidores continuarão comprando. Ele assegura que o sucesso da proposta depende da adesão global e da aplicação eficiente dos recursos, principalmente em saúde pública e desenvolvimento sustentável.
Outro ponto crucial destacado por Meza é o risco de contrabando e produção ilícita, que pode aumentar conforme os preços sobem. “Investir em combate ao contrabando é fundamental para garantir a eficácia da política e a arrecadação”, alerta. Ele considera viável a inclusão dos ultraprocessados, embora reconheça ser uma tarefa mais complexa, citando exemplos exitosos de outros países, particularmente no que se refere ao tabaco.
Apesar das divergências, ambos os especialistas concordam que o foco principal da proposta da OMS deve ser a saúde pública. Além disso, afirmam que a indústria terá que se reinventar para atender às novas demandas e que o comportamento do consumidor tende a mudar, assim como aconteceu com a redução do tabagismo.