
A adoção, em 2024, do novo símbolo internacional de acessibilidade no Brasil reacendeu o debate sobre inclusão. A imagem substitui a figura da cadeira de rodas por uma pessoa de braços abertos dentro de um círculo, transmitindo ideias de movimento, autonomia e participação social.
Mais do que um ícone, a mudança amplia o conceito de acessibilidade, deixando de focar apenas na mobilidade física para abranger comunicação, empatia e adaptações necessárias para deficiências auditivas, visuais, intelectuais e psicossociais.
Para o defensor público e professor Allan Joos, a novidade representa uma mudança de paradigma. “O antigo modelo representava a limitação do corpo. O novo mostra que a exclusão nasce das barreiras sociais e estruturais. Ele representa um olhar mais humano e plural”, afirma.
A alteração, prevista no Projeto de Lei nº 2.199/2022, reforça compromissos do Brasil com a Convenção sobre os Direitos das Pessoas com Deficiência (CDPD), da ONU, e visa impulsionar políticas públicas e práticas empresariais mais inclusivas em setores como o de alimentação fora do lar.
Acessibilibar: quando a inclusão vira propósito
Em Belo Horizonte, a jornalista Aline Castro transformou a própria experiência em um projeto prático. Nascida com atrofia muscular espinhal e usuária de cadeira de rodas, ela criou o Acessibilibar após identificar a falta de banheiros adaptados, rampas adequadas e mesas acessíveis em bares da cidade.
“Recebia mensagens de pessoas perguntando se eu conhecia lugares realmente adaptados. Percebi que havia uma demanda enorme e pouca informação. A acessibilidade é lei, mas muitas vezes falta conscientização”, conta Aline.
A iniciativa avalia estabelecimentos quanto à estrutura física, cardápios acessíveis e preparo das equipes. Os locais aprovados recebem o selo Acessibilibar, que reconhece o compromisso com a inclusão. “Não basta permitir a entrada. É preciso garantir que o cliente possa permanecer com conforto e dignidade”, afirma a criadora do projeto.
Desde a criação do Acessibilibar, dezenas de bares e restaurantes ajustaram seus espaços e passaram a capacitar funcionários para um atendimento mais empático. Segundo Aline, acessibilidade não é custo, é investimento: ambientes inclusivos fidelizam clientes e ampliam audiência.
Um restaurante pensado para o público autista
Em Guaíba (RS), o casal Vinícius e Kelli Longaray adaptou o negócio após experiências pessoais como pais de Enzo Gabriel, de cinco anos, diagnosticado com Transtorno do Espectro Autista (TEA). Assim nasceu o Espetinho do Vini, apontado como o primeiro restaurante do país pensado para atender crianças autistas.
O espaço prioriza luz suave, controle de ruídos e dispõe de uma área sensorial com brinquedos táteis e fones de ouvido para quem se incomoda com som. Mesas têm adesivos informativos sobre o autismo, contribuindo para a conscientização do público.
O cardápio inclui porções pequenas adaptadas a crianças com seletividade alimentar. “Não posso cobrar R$ 20 de um prato que a criança não vai comer. Cobro R$ 2 e garanto que a família se sinta bem”, explica Vinícius.
A iniciativa atrai famílias de várias cidades e transformou o restaurante em referência de acolhimento. “É um ambiente tranquilo, onde nossos filhos se sentem bem. Podemos comer sem pressa”, relata Thainá Moraes, mãe de uma criança com autismo que frequenta o local.
Acessibilidade como estratégia de fidelização
Dados recentes da Abrasel apontam um cenário difícil para bares e restaurantes: 27% registraram prejuízo em setembro, 40% operaram em equilíbrio e apenas 33% tiveram lucro. Quatro em cada dez empresários não reajustaram preços nos últimos 12 meses, e a mesma proporção enfrenta pagamentos em atraso.
Nesse contexto, tornar o estabelecimento acessível pode ser uma vantagem competitiva. Ambientes que acolhem pessoas com deficiência, famílias com crianças autistas e outros públicos ampliam o alcance do negócio, fortalecem a reputação e constroem fidelidade.
O novo símbolo internacional de acessibilidade, com braços abertos, sintetiza essa ideia: incluir é abrir espaço. Para bares e restaurantes, isso significa abrir portas para novos clientes, novas histórias e um futuro mais justo e sustentável.



